sexta-feira, julho 03, 2009

O TRÂMITE DA SOLIDÃO



Imagem: Alter ego de Val Byrne

ALTER EGO

Luiz Alberto Machado

Abri a porta e o céu estava cinzento
E na penumbra da sala
O meu coração está feliz com os acordes do Koln Concert de Keith Jarret

A minha pena ainda transcreve imagens da cabeça:
um asno na lira e seus fragmentos múltiplos desentoados
De pedaços outros

Deus me abençoe
Deus me proteja nessa desolação
Uma ausência que atormenta

Joguei meu último poema no riacho
E outros tantos no interior das garrafas para jogá-los ao mar
Quem sabe alguém desavisado
Não se importune ao ler meus versos

A solidão me silenciou
Estou esvaziado
Logo eu que vim curumba da terra batida do Una
Nascido em sessenta com Brasília e o videoteipe
Expondo agora sintaxes exclusivas do coração
Inauguro a minha agonia
Eu que morri tantas vezes sem chegar ao desespero
Que vim de longe, de um mundo pequeno
Onde hoje a vida é quase reduzida a uma condição inóspita

Eu que ergui a minha própria casa
O meu contíguo pardieiro
E fiquei entregue ao meu abandono
Sem nunca haver ambicionado grandes palácios
Ou usado um cajado para imprimir a ordem

Eu que sou o mar que beija a terra
Na pose mais íntima de se amar

Sou eu que valho o que medra nada
Um astronauta intrépido no mundo da lua
Um zagueiro insone das coisas da minha gente
Um lavrador dos dias que venham depois

E quando beijo eu sou de mim o que é para todos
E quando abraço eu sou de graça o que é de mim
E quando sorrio eu sou de paz prá não ser guerra
E quando eu choro eu sou em flor mais que a ternura

Sou eu calor a quarenta e tantos graus
Eu sou o tom de si, de mim, Jobim
O tom que salte, deite, Waits
O que faz, que foi, que é, Tom Zé
O tom depois, de antes, Tom Cavalcanti

Sou eu que gosta de cheirar xibiu de moça donzela
Sou a que já no caritó reza todas as noites por Santo Antônio casamenteiro ajeitar um príncipe encantado para esquentar os pés nas noites de frio

Sou meu coração Caravaggio pintando o sete e santos
E sempre atraído pela promiscuidade e rebeldia

Meu coração de frases obscenas na calada da noite
Na luta para não ser devorado na competição natural da vida

Meu coração pavão a legislar em causa própria
Sempre a me desvencilhar da espada de Dâmocles sobre a cabeça

Sou eu que tenho a força do braço Anteu sem poder largar o chão do meu país
Eu, depositário de tudo, sempre paguei o pato
Azougado como quê, completo de emoção
E sob o efeito do álcool, hum! um timoneiro na proteção de mercúrio seduzido pelo insólito já que nada me é estranho

As minhas batalhas algumas ganhei, muitas perdi
Nunca gostei de jogo, claro, um mau jogador

Coisas que vi que fiquei passado
Nomes que não sei dizer
Ainda perdi o que de melhor me restava

E tive de ser São Jerônimo depondo à caveira
Aguçando os meus cem olhos de Argus
Apenas sabendo o que é bom ou mal por ser desobediente
Plagiando Shulock
“Us” de Peter Gabriel
e o meu trono absoluto no banheiro
reunindo os meus pecados
You’re the top de Cole Porter
A fascinação pelo proibido

Os meus gritos até me assustam
E alguns até me extasiam

Eu divido a minha mesa
Partilho a minha alegria
Meu ancestral fenício
Minha herança viking

Devo estar me masturbando:
Minha solidão
Meu claustro
Duvido que eu tenha sanidade mental

Os demônios estão soltos
Quem sabe e por alguma forma possam me perdoar

Eu sei dos meus fracassos no meio dos sonhos de Kurosawa

Bastar-me-ei a mim mesmo se de mim
Sobrar alguma coisa


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